segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Marx (2): O Início do Marxismo

Na postagem anterior sobre Marx foram citadas então duas concepções importantes dele: uma de que a economia é a principal forma da alienação da humanidade e a outra, que diz que a emancipação da humanidade da dominação pela economia terá de ser feita pela classe trabalhador. Já nessa, serão demonstrados alguns conceitos encontrados em "O Capital" e nos "Manuscritos econômico-filosóficos".
Após ter iniciado seu estudo sobre economia e utilizando seu conhecimento sobre as teorias econômicas clássicas de Adam Smith e J-B. Say , Karl demonstra de forma bem simples como o trabalhador se tornara apenas uma mera mercadoria, estando sujeito assim, às leis da oferta e procura.

Seu raciocínio é, resumidamente, o seguinte: se a oferta de trabalhadores excede a demanda, os salários sofrerão uma queda. Assim, os salários tendem a se manter mais baixos o possível, só sendo necessário estar num nível suficiente para que haja a manutenção de uma oferta suficiente de trabalhadores vivos. Essa conclusão se torna mais clara a partir da observação, também depreendida da economia clássica, de que os capitalistas obtém seu lucro por meio da exploração de seus empregados; ou seja, eles conseguem seu lucro devido a horas não pagas de trabalho do proletariado, que é o que Marx denominou de mais-valia . Assim, o capital nada mais é além de trabalho acumulado e ,com esse capital excedente, se constroem fábricas maiores com mais máquinas. Isso aumenta a divisão do trabalho, deixando mais trabalhores sem serviço, o que intensifica a competição entre os trabalhadores e abaixa os salários.
É importante ressaltar que Marx não pretendia ser um economista nem escrever como um, ele só desejava "elevar o nível da ciência econômica", pois tal ciência simplesmente aceitava uma série de absurdos, como: a propriedade privada, a ganância, a competição etc. Ele pretende trazer a tona questões mais amplas e triviais ao homem, já que "É evidente que a economia estabelece uma forma alienada de intercurso social como a forma essencial, original e natural".
Ainda nos manuscritos, Karl alega que é na produção que os seres humanos se revelam pertencentes à mesma espécie. A razão disso é que "enquanto animais só produzem para satisfazer suas necessidade imediatas, os seres humanos podem produzir de acordo com padrões universais, livres de qualquer necessidade imediata" - por exemplo, de acordo com padrões de beleza. Segundo essa ideia, o trabalho como atividade produtiva livre é a essência da vida humana. Como consequência, o que quer que se produza desse modo é a essência da vida humana transformado num objeto físico (é o que ele chama de "objetificação do ser específico do homem"). Porém, em condições de trabalho alienado, os trabalhadores se encontram alienados de sua essência humana; em outras palavras, como os trabalhadores têm que produzir coisas sobre as quais não possuem nenhum controle, pois elas pertencem aos seus empregadores, e que são usadas contra eles mesmos (por aumentar a riqueza e o poder dos empregadores), os proletariados acabam se alienando de sua humanidade essencial. Algumas consequências desse processo são: a o estado de alienação dos homens uns dos outros, a atividade produtiva se torna "atividade sob a dominação, a coerção e o jugo de outro homem" e, em decorrência disso tudo, ao invés de nos relacionarmos cooperativamente, nos relacionamos competitivamente. Por isso, os seres humanos deixam de se reconhecer uns nos outros e vêem-se uns aos outros como instrumentos para promover seus próprios interesses egoístas. Essas são as primeiras críticas de Marx à economia, sendo elas formadoras da sua concepção acerca do que estaria realmente errado com a condição da humanidade.
Agora, há uma próxima questão, a qual é muito provável você já tenha se perguntado, a ser tratada. Ei-la : o que deve ser feito a respeito disso? Para Marx a resposta não é uma elevação dos salários, nem mesmo um salário igual para todos como havia proposto Proudhon, pois não seria "nada além de um salário de escravo melhor", já que esse salário igual não devolveria a importância e dignidade dos trabalhadores. O estabelecimento de salários iguais só substituiria os capitalistas individuais por um capitalista global, a própria sociedade. Além disso, o trabalho em troca de salário não é uma atividade produtiva livre. Logo, a solução é a abolição do salário, do trabalho alienado e da propriedade privada. Por esse motivo é que "O comunismo [...] é a solução genuína do antagonismo entre homem e natureza e entre homem e homem [...], entre liberdade e necessidade, entre indivíduo e espécie. É o enigma da história solucionado [...]" (Aqui se torna vísivel novamente a influência da Fenomenologia do Espírito de Hegel). Infelizmente, ele não informa detalhadamente o que seria a sua concepção de comunismo, não explica suficientemente como deveria ser esse tal comunismo que seria a solução dos problemas da humanidade.
Só resta esta curta afirmação final a ser tratada: todos os sentidos humanos são degradados pela propriedade privada. Essa asserção se torna evidente se tomarmos como exemplo um negociante de minerais, porque esse não vê a beleza das jóias que negocia, mas sim o seu valor no mercado. Nessa condição alienada causada pela propriedade privada, não se pode apreciar nenhum objeto de verdade a não ser possuindo-o ou usando-o como um simples meio para algo. Portanto, somente a abolição da liberdade privada libertaria-nos os sentidos desta alienação e nos possibilitaria apreciar o mundo de uma forma verdadeiramente humana, ou melhor, da forma verdadeiramente humana.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Marx: Introdução

Desviei um pouco o curso das postagens por ter antecipado Proudhoun após já ter explicado (Na postagem sobre os Jovens Hegelianos) parte do contexto filosófico em que Marx se encontra, então hei de por-me em ordem agora.
Karl Marx seguira de certa forma a reinterpretação de Hegel como um filósofo do homem, e não do Espírito, do mesmo modo que Bauer e Feuerbach faziam. Porém, a partir da publicação de "A Questão Judaica" (1843), começou a enfatizar a questão material e econômica . Esse ensaio foi uma resposta ao modo como Bauer havia tratado a questão dos direitos civis e políticos para judeus, de modo que Marx discorda dele ao alegar que não é o sabá que devemos considerar, mas o cotidiano judeu. Nesse texto ele diagnostica o judeu como uma manifestação do que ele chama de "judaísmo na sociedade civil"; em outras palavras, a dominância dos interesses financeiros na sociedade em geral. Ao fazer isso, não é posta como causa da alienação da humanidade a religião, mas sim, o dinheiro. Karl sugere então que seria necessário uma reorganização da sociedade de modo a abolir as relações comerciais. Logo, ao dizer que "O dinheiro é o valor universal e autoconstitutivo de todas as coisas. Assim, ele privou o mundo todo, o mundo humano e também a natureza, de seu valor próprio. O dinheiro é a essência alienada do trabalho e da vida do homem, e essa essência alienada o domina quando ele a cultua", Marx revela, de certa forma, o rumo para a liberdade humana.

O Proletariado entra em cena

Em "Introdução à crítica da Filosofia do Direito de Hegel", encontra-se a primeira vez em que Marx chega a conclusão de que só crítica não é o suficiente: "A arma da crítica evidentemente não pode substituir a crítica das armas. A força material tem de ser destruída pela força material. Contudo, a teoria também se torna uma força material uma vez que tenha atingido as massas". Com isso, ele deduz que é necessario de "uma classe com grilhões radicais (...), de uma esfera da sociedade com um caráter universal em virtude de seu sofrimento universal (...), uma esfera, em suma, que é a perda completa de humanidade e que só pode se emancipar por meio da emancipação completa da humanidade. Esta dissolução da sociedade como uma classe particular é o proletariado". Devido a isso: "A filosofia não pode ser realizada sem a superação do proletariado, o proletariado não pode ser superado sem a realização da filosofia". Por realização da filosofia entende-se a realização do processo dialético da humanidade, o qual foi ilustrado por Hegel em sua "Fenomenologia do Espírito". Marx também afirma que a classe média proprietária consegue obter liberdade para si com base nos direitos de propriedade, excluindo assim os outros da liberdade que conquistam, e, consequentemente, privando a classe trabalhadora, que possui somente seu título de seres humanos, da liberdade. Em decorrência de tudo isso, os proletariados só podem se libertar libertando consigo toda a humanidade. Resumindo, devido ao caráter universal da alienação humana, sua resolução tem de ser também por algo de caráter universal, e o proletariado tem essa universalidade devido à sua total privação, se tornando a resolução do problema da não-liberdade e da autoalienação humana no capitalismo. O proletariado não representa somente a classe trabalhadora para Marx, ele representa toda a humanidade.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A propriedade é um roubo!

"Se eu tivesse de responder à seguinte questão: o que é a escravidão?, e a respondesse numa única palavra: é um assassinato, meu pensamento seria logo compreendio. Eu não teria necessidade de um longo discurso para mostrar que o poder de tirar ao homem o pensamento, a vontade, a personalidade é um poder de vida e de morte, e que fazer um homem escravo é assassiná-lo. Por que então a esta outra pergunta: o que é a propriedade?, não posso eu responder da mesma maneira: é um roubo, sem ter certeza de não ser entendido, embora esta segunda proposição não seja senão a primeira transformada?"
E assim se inicia "A Propriedade é um Roubo" de Pierre Joseph Proudhon, um dos grandes expoentes da economia política socialista e do anarquismo. Vou tentar, ao longo dessa postagem, demonstrar os pontos importantes que ele trata nesse texto.
Antes de começar a falar de propriedade, é importante ressaltar que Joseph lutava pela liberdade do homem, pela fim da opressão e, como todo homem de visão ampla, pelo fim da exploração do homem pelo homem. Porém, a anarquia que ele defende não é, como muitos pensam, uma total desorganização, mas sim uma "perfeita" organização. Proudhon foca a questão da organização da anarquia gerada pela liberdade, sendo esta essencialmente organizadora para ele, pois "para assegurar a igualdade entre os homens, o equilíbrio entre as nações, é preciso que a agricultura e a indústria, os centros de instrução de comério e de armazenamento sejam distribuídos segundo as condições geográficas e climáticas de cada país, a espécie de produtos, o caráter e os talentos naturais dos habitantes etc., em proporções tão justas, tão sábias, tão bem combinadas, que lugar algum apresente nem excesso nem ausência da população, de consumo e de produto. Aí começa a ciência do direito público e do direito privado, a verdadeira economia política", afirma ele. Desse modo, pode-se compreender melhor sua posição anarquista ao alegar que "A política é a ciência de liberdade: o governo do homem pelo homem, sob qualquer nome que se disfarce, é opressão; a mais alta perfeição da sociedade se encontra na união da ordem e da anarquia" .
Agora, voltando para o assunto principal, para justificar que a propriedade é um roubo, Joseph usa o conceito da mais-valia de Marx. Assim, ele demonstra que, por meio da propriedade e explorando os proletariados, os capitalistas (Ou proprietários dos meios de produção) obtêm seu lucro, ou seja, por ter a propriedade e os meios de produção, o capitalista paga somente uma parcela do que o que o trabalhador produz, sendo a diferença entre o que o último produz pelo que o primeiro o paga o lucro do capitalista. Assim, a propriedade privada e os meios de produção fazem que o capitalista seja um ladrão e, portanto, a propriedade é roubo. Porém, ela é também impossível e homicida, já que "a propriedade, após despojar o trabalhador pela usura, assassina-o lentamente pelo esgotamento; ora, sem a espoliação e o assassinato a propriedade não é nada; com a espoliação e o assassinato ela logo perece, desamparada: logo, é impossível".
Para finalizar, deixo aqui algumas palavras dessa obra do Prodhoun :
"Jovem, que a corrupção do século indigna e que o zelo da justiça devora, se a pátria vos é querida, e se o interesse da humanidade vos toca, ousai abraçar a causa da liberdade. Renunciai a vosso velho egoísmo, mergulhai na onda popular da igualdade nascente; lá, vossa alma revigorada retirará uma seiva e um vigor desconhecidos: vosso espírito debilitado reencontrará uma indomável energia; vosso coração, talvez já enfraquecido, rejuvenescerá."

"Em meus primeiros relatórios, atacando de frente a ordem estabelecida, eu dizia, por exemplo, a propriedade é um roubo! Tratava-se de protestar, de, por assim dizer, colocar em relevo a fragilidade de nossas instituições."
- Proudhoun

terça-feira, 27 de julho de 2010

Um pouco sobre Hegel e os "jovens hegelianos"

A Fenomenologia do Espírito de Hegel é um pensamento de extrema importância, devido à sua reinterpretação por Marx, Feuerbach e Bauer principalmente (Para mim, esses fizeram o uso mais interessante da filosofia hegeliana).
De acordo com Hegel, existe um Espírito que é infinito e inerentemente universal, do qual somos todos parte. Mas em sua forma limitada, como o espírito de indivíduos particulares, não é consciente de sua universalidade. Essa não-autoconsciência, seria a "alienação" do Espírito de si mesmo, de modo que as pessoas vêem as outras como algo estranho e externo a si mesmas, quando na verdade todas fazem parte do mesmo todo (O Espírito universal). A Fenomenologia do Espírito apresenta o desenvolvimento do Espírito desde seu primeiro aparecimento como espíritos individuais alienados de si mesmos (e devido a essa alienação, os espíritos individuais ainda não são livres), até o Espírito livre e consciente de si (autoconsciente). O processo de seu desenvolvimento é a síntese de um processo lógico com um histórico e é dialético. O desenvolvimento do Espírito tem como objetivo chegar à liberdade, mas ele não pode ser livre estando alienado, pois estando alienado ele encontra barreiras e oposições a seu desenvolvimento completo, já que considera as outras pessoas como algo externo a si mesmo, como algo estranho. Essas forças externas e aparentemente estranhas limitam sua liberdade, pois se ele não está ciente dos seus próprios poderes infinitos não pode exercê-los para organizar o mundo de acordo com a sua vontade. Pode-se resumir esse progresso com a frase "A história do mundo não é nada mais que o progresso da consciência da liberdade" de Hegel.
É claro que não preciso declarar meu ateísmo e que não acredito em nenhum Espírito universal e inifinito. Por esses mesmos motivos, alguns filósofos, denominados de jovens hegelianos radicais , se deram o direito de esclarecer a teoria de Hegel e de acusá-lo de trair a sua própria filosofia (Ao parecer considerar o Estado prussiano como o grande Espírito, provavelmente por que dependia do salário que o Estado lhe pagava). Esses jovens hegelianos reinterpretaram o "Espírito" de Hegel como todas as mentes humanas, como a "autoconsciência humana", transformando assim o desenvolvimento da humanidade como um progresso rumo à liberdade humana. Isso também não quer dizer que Hegel não criticasse as religiões. Ele entendia a religião cristã como uma forma de alienação do espírito, pois enquanto os deuses se encontram na perfeição do céu os seres humanos vivem num "vale de lágrimas" relativamente insignificante. A natureza humana no cristianismo está dividida entre sua naturez essencial, imortal e divina, e sua naturez não-essencial, mortal e terrena. Desse modo, as pessoas vêem sua própria naturez essencial como sendo de outro domínio, logo, estão alienadas de sua existência mortal e do mundo que vivem. Mas ele considerou esta uma fase passageira da auto-alienação do Espírito e não concluiu nada sobre a religião.
Bauer reinterpretou essa ideia de modo a concluir que o cristianismo é a auto-alienação dos seres humanos. Para ele os próprios homens criaram Deus que agora parece ter existência independente, o que impede os homens de verem a si mesmos como a mais alta divindade. Essa conclusão tem um objetivo prático, pois ao mostrar à humanidade que Deus é sua criação, acabaria com a subordinação do homem a Deus e com a alienação dos seres humanos à sua própria natureza.
Feuerbach concordava com Bauer nesse sentido, mas alegou ainda, que Deus deve ser visto como a essência da humanidade projetada numa realidade estranha, exteriorizada. Todos os atributos de Deus, como o amor por exemplo, são na verdade características humanas, mas o homem as atribui, numa forma mais purificada, a Deus. Assim, quanto mais enriquecemos Deus com essas características, mais empobrecemo-nos delas, mais nos auto-alienamos e nos impedimos de ir rumo à liberdade. Disso surge a implicação de que a teologia é a antropologia disfarçada, de que aquilo que acreditamos a respeito de Deus refere-se, na verdade, a nós. Desse modo a humanidade poderia recuperar sua essência perdida na religião. Por mais essa teoria de Feuerbach pareça plausível, é irônico perceber que ele usa o método hegeliano não somente contra as religiões, mas até com a própria filosofia de Hegel! Ele alega que ao Hegel assumir o Espírito como a força principal da história e os homens como meras manifestações do Espírito, Hegel põe a essência dos seres humanos fora da humanidade e, do mesmo modo que as religiões, aliena o homem de si mesmo.

sábado, 17 de julho de 2010

Responsabilidade, Liberdade e Moral no existencialismo

A responsabilidade, de acordo com as obras de Sartre, decorre da obtenção da liberdade do indivíduo, pois a partir daí pode mudar sua vida e fazer escolhas. É verdade que somos privados de muitas liberdades e, como Sartre disse, não conhecemos a verdadeira liberdade, pois a que conhecemos é uma liberdade alienada. De acordo com ele a liberdade verdadeira irá surgir somente quando a filosofia marxista explodir, se realizar. Mas mesmo assim, não somos nunca privados de escolher, podemos tomar como um exemplo Stephen Hawking, que sofre de ELA (Esclerose Lateral Amiotrófica), perdeu todos os seus movimentos, mas mesmo assim ainda escolhe, ainda assim escreve livros e realiza estudos importantes. Deixando um pouco de lado a questão da verdadeira liberdade que não podemos desfrutar, a liberdade que temos nos causa angústia, nos amedontra diante de toda a responsabilidade que temos que assumir ao tomar uma decisão. Ao escolher, não escolhemos somente o nosso futuro, não nos responsabilizamos somente pelo que vai acontecer a nós, nos responsabilizamos por nós e pelos outros, por toda a humanidade. Essa responsabilidade sartreana, que nos põe diante do mundo, que culpa-nos pela situação histórica que vivemos, é a filosofia da ação em si. Não há como nos depararmos com tamanho peso em nossos ombros e não fazermos nada, pois esse peso que carregamos é o pesar da liberdade, é a própria liberdade.
É possível fugir dessa responsabilidade por toda a humanidade negando a nossa liberdade ao dizer que optamos por algo devido aos costumes, às leis e à moralidade ou a uma religião que nos "controla". Mas a verdade é que estaríamos mentindo para nós mesmos. "Escolher ser isto ou aquilo é afirmar, concomitantemente, o valor do que estamos escolhendo ..."(Sartre). É a nossa consciência que dá valor as coisas, que em si não tem valor nenhum. De acordo com Sartre isso é agir de "má-fé" (mauvaise foi no original). Logo, agir de má-fé é, para ele, esquivar-se da responsabilidade pelos próprios atos, depositando-a em alguma influência externa, podendo ser um deus, a lei ou a moralidade. Não existe algo como uma única moral ou ética para o existencialismo satriano. Cada momento e cada situação cria caminhos para serem escolhidos e para cada escolha é inventado um novo homem e uma nova moral.
Isso não significa que não exista uma moral e nada esteja errado. A responsabilidade antes dita leva a um homem responsável por uma escolha realizada, mas não apenas para ele, não só atráves da subjetividade dele, mas através de uma intersubjetividade que leva em conta a liberdade do outro, de toda humanidade e o seu compromisso com a situação. Por isso, não é importante que a moral seja fixa e absoluta, o que importa é que ela seja uma moral de compromisso, de responsabilidade, com a qual as escolhas são feitas em função da liberdade humana.
Outro ponto importante é a sua citação de que "todas as atividades humanas são equivalentes (...) Assim, vem dar no mesmo uma pessoa se embebedar sozinha ou liderar nações." É claro que as críticas seriam extremamente agressivas em relação a essa afirmação, mas ela está justificada pelo fato de que na filosofia de Sartre as pessoas escolhem realizar um ato melhor do que o outro por sua própria escolha; ou seja, ao agirmos, a nossa ação implica toda uma nova moralidade, quer gostemos ou não disso. Desse modo, somos responsáveis por toda uma ética, somos nós quem fazemos com que "liderar nações" seja melhor do que "se embebedar sozinho", nos mostrando que, ao nos conscientizarmos dos nossos atos, nos tornamos responsáveis por eles. Para o filósofo é isso que importa, ter consciência, pois, para ele, isso já bastaria para fazer pensar.
Em suma, da liberdade decorre o homem tal como é e toda a humanidade e história tal como se encontra, decorrendo também a responsabilidade do homem para com a humanidade. Responsabilidade que por sua vez leva à angústia e à criação de uma moral diferente para cada situação, mas que leva em conta a sua liberdade, a liberdade de todos os outros e o compromisso com a situação.

"O primeiro efeito do existencialismo é que ele coloca todo homem na posse de si mesmo tal como é e põe toda a responsabilidade por sua existência nos seus próprios ombros."

- Jean Paul Sartre

(Texto editado em 10/09)